Durante toda a minha vida eu fui contando mentiras pra mim. O interessante é que à medida que o tempo foi passando essas mentiras foram se tornando realidade. Não só porque eu passei a acreditar nelas, mas também porque eu fui fazendo minhas escolhas baseadas nelas e assim fui moldando a minha vida. Talvez isso tenha começado na infância é uma reposta plausível. Mas eu não acredito que descobrir a gênesis do problema seja a única maneira de resolver a questão. Saber como tudo começou me ajuda a entender as minhas escolhas, mas não tira a minha responsabilidade sobre elas. Não sou uma vitima do mundo, uma incompreendida, eu sou uma mulher madura, que viveu mais de 50 anos, que fez escolhas boas e outras ruins, não importa. Esse texto não é pra chorar sobre o leite derramado. Eu quero falar de mim, de quem eu sou, de quem eu me tornei. E quem é essa mulher, hoje?
Fazer essa pergunta, fez transparecer um sorriso no canto da boca. Eu não sou mais uma menina de oito anos que foi acordada no meio da noite, pela notícia de que o pai, que ainda pouco ela estava conversando, morreu. Naquela noite, a minha infância acabou. Dali em diante eu tinha que cuidar da casa, apoiar a minha mãe e ajudar a cuidar das minhas irmãs. E quem iria cuidar de mim? Coloquei uma coisa na minha cabeça, eu vou cuidar de mim, não preciso de ninguém. Triste mentira, doce ilusão e hoje eu sei disso.
Como eu sei? Simplesmente eu sei que embora eu possa cuidar de mim sozinha, eu não quero fazer sempre isso. Saber que somos todos sozinhos, que ninguém no mundo pode suprir as minhas carências, não me impede de ter pessoas a minha volta. Eu não quero viver sozinha. Chegar a está conclusão não significa que eu vá querer que meus filhos vivam comigo pra sempre, já tem um tempo que eles não moram comigo. Isso também não significa que eu precise casar, não é sobre isso que eu estou escrevendo. O fato de morar sozinha não me isola do mundo e nem das pessoas.
Eu moro sozinha, mas eu escolho viver em comunhão, eu escolho o amor, a partilha, eu escolho dar e receber amor. E como eu faço isso, eu me cerco de uma rede de proteção, eu não me isolo. É verdade que essa mulher que hoje eu me tornei, esqueceu aquela antiga mentira de que não precisa de ninguém. Eu sei que eu preciso das pessoas, eu não vivo sozinha no planeta, e isso é muito bom. Imagina se só existisse eu no mundo, sem ninguém para interagir, amar, brigar, se desculpar, conversar. Mesmo que seja através de frases rápidas com o porteiro, comprar um pãozinho na padaria ou coisas mais complexas e interessantes, como almoçar com os filhos, conversar com os sobrinhos. Bater um longo papo com suas irmãs ou irmãos, orar com as pessoas da igreja, dar um beijo na pessoa amada. Eu precisei viver mais de 50 anos pra dizer isso, eu não quero viver sozinha.
E você quer viver sozinha?
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